sábado, março 09, 2013

SUELI COSTA



Foto: Rogério Reis



SOLIDÃO

Luiz Alberto Machado

Se um dia eu tivesse a canção
Uma apenas seria o bastante
E se a tanto chegasse à paixão pelos alto-falantes
Há tempos que eu não sei

Ah, há o hesitante teibei
Eu sei por que não ganhei tudo
Que a vida me deu, nem perdi nem me iludo,
Só aconteceu

É tudo medonho
Até quando o sonho se foi e valeu
Por todas as vozes que são minhas
E guardo sozinha às braçadas
Das guerras perdidas regadas
E eu nada mais sei
Mais nada.

E calada, todas as vozes sou eu gritando xexéu na barra do dia
Todos os risos são meus na alegria,
Todas as dores são minhas quando vivo à tardinha
Todas as sombras do que vivi.

Sobrevivi e meu canto
É a minha carne em postas pelo amor
Dissolvida em gemidos, em versos decomposta
O sabor na resposta da iguaria
Que é a minha poesia que acendeu,
Venha se servir, a mesa esta posta
Só sou eu e o amor, nada mais,
Nada mais, só sou eu.


Tinha eu lá uns 15 anos de idade, por aí, quando tive às mãos o primeiro disco da Sueli Costa. Como sempre fui pesquisador desde menino, eu queria sempre ver coisas novas. Nunca tinha ouvido falar. Gostei de cara, uma poderosa descoberta, como foi a de Joyce, Dolores Duran, Maysa, Amelinha, Fátima Guedes.
Ouvi por todo panteão da música brasileira, começando por Elis, coisas dela. Muitas por Simone e por aí vai.
Quando “Face a face”, “Jura Secreta”, “Alma”, “Coração ateu”, “A canção brasileira” e, especialmente “Cão sem dono” – esta última que passei noites e noites regadas a muitos goles e baforadas, curtindo eternElis, que eu já sabia que ali estava uma compositora e seus muitos parceiros, gente do primeiro time. Cada melodia encantadora, cada verso envolvente e mágico, cada canto maravilhoso.
Com o tempo fiquei sabendo que ela nasceu no Rio de Janeiro e que se tornou mineira de coração. Aprendeu piano com a mãe que dava aula de canto coral, integrou o Trieto familiar com as irmãs Telma Costa e Lisieux Costa, além de ser irmã de um pianista e de outro violonista.
Compôs sua primeira canção na adolescência, aos 17 anos de idade: Balãozinho. Até que Nara Leão gravou em 1967 sua parceria com João Medeiros Filho, “Por exemplo, você”.
Em 1969 abandona a faculdade de Direito e se muda pro Rio de Janeiro dando inicio a uma carreira de muito sucesso ao lado dos parceiros Cacaso, Tite de Lemos, Ana Terra, Aldir Blanc, Capinam, Fausto Nilo, Paulo Cesar Pinheiro e Abel Silva, entre outros.
Hoje é um baluarte da música brasileira, grandiosa em sua serena majestade. Com um detalhe: acessível, genial e gentil. De forma simpática ela conversou com a gente nessa conversa exclusivíssima.



LAM - Sueli, vamos pra pergunta de praxe: como foi e quando se deu seu encontro com a música?
Meu encontro com a música se deu desde sempre.Ouvia música em casa desde que nasci. Minha mãe era professora de piano, quando eu era pequena, e aos 4 anos, ela viu que eu já precisava aprender música, ao cantar certo uma nota que a aluna tinha tocado errado...Antes mesmo de ser alfabetizada já estava tocando piano.

LAM - Quais as influências da infância e da adolescência que marcaram a formação da compositora?

Ah, o repertório de Nara Leão, as canções lindas de Johnny Alf, Silvia Telles cantando, a música do Tom, João Gilberto, e o jazz costurando tudo, principalmente Miles Davis

LAM - Você vem de uma familia em que todos estão ligados à música, isso contribuiu para o fato de você, aos 17 anos, compor Balãozinho, sua primeira canção? Como se deu isso? O que motivou você a bater o centro na carreira de compositora?

Não dava pra ser de outra forma. Minha mãe era professora de música e quando cresci, era professora do conservatório de Juiz de Fora. Ali estudei, fiz o curso de professora de música. Meus irmãos todos eram compositores, e minha irmã, Telma, já falecida, era cantora, mas tinha uma composição com o Tite de Lemos, e gravou com o Chico Buarque"Eu te amo"., e gravou também um LP muito bonito com arranjos de Dori Caymmi e Cesar Camargo Mariano. Meus dois irmãos são violonistas e minha irmã, Lisieux Costa gravou também um LP que foi lançado pela gravadora Velas.

LAM - Conta pra gente como foi seu começo, o ensino de música nas escolas até chegar no Alice no país do divino maravilhoso com o Sindey Miller!

Em Juiz de Fora, quando estudava Direito, já dava aulas de música nos colégios. Quando vim para o Rio, fiz concurso para lecionar no Estado. Sidney Miller me convidou para dividir com ele as canções de um musical "Alice no país divino maravilhoso" O parceiro dele neste musical, Grisolli, aí resolveu também chamar o Tite, para escrever com ele o texto. Assim conheci o Tite. Também entraram Luiz Carlos Maciel e Marcos Flasckman, ambos ligados ao teatro e o que se chamava contracultura. Cada capitulo dessa história era debatido na casa do Sidney, com direito a muito uísque e cerveja.

LAM - Como foi que se deu a realização do seu primeiro lp, que contou com produção de Gonzaguinha, em 1975?

Em 74 Maria Bethania fez o show A Cena Muda, com direção de Fauzi Arap e cantou no show 8 músicas minhas. A Odeon, que já teve o melhor cast que se pode imaginar, e tinha o Gonzaguinha, logo me convidou para fazer o LP e o Gonzaguinha se ofereceu para ser o meu produtor. Aprendi muito com ele, durante as gravações. Eu nunca tinha entrado num estúdio e, ele me deu a confiança de que eu precisava.

LAM - Em 77 você lança seu segundo lp com produção da dupla João Bosco & Aldir Blanc e, depois, manda ver com Vida de Artista (1978), Louça Fina (1980), Intimo (1984) e Minha Arte (2000), em todos eles desfilando, suas canções, letras e poemas seus e de seus sensacionais parceiros que nos presentearam com sucessos que foram embalados pelas mais representativas vozes da música brasileira. Fala, então, desse seu trabalho autoral e da relação com os parceiros poetas e letristas. É na sua música que você mostra a sua poesia? São também músicas para as vozes dos poetas ou poesia para suas músicas?

Tive muita sorte com meus parceiros. É um elenco estelar e são todos amigos do peito. Foi também decisivo para essas parcerias o fato de um me apresentar ao outro. Assim João Medeiro Filho, meu primeiro parceiro me apresentou ao Cacaso e ao Abel. E o Abel me apresentou ao Capinam e ao Fausto Nilo. Aldir era amigo de amigos meus e do João. Não vejo minhas músicas como voz para a poesia, embora já tenha musicado Cecilia Meirelles e Fernando Pessoa. Acho que todo mundo quer coisa boa e de qualidade, e, claro, poesia! Acho que a poesia, enfim, é que invadiu a minha música.

LAM - Em 2007, você lançou Amor Blue, um cd trazendo as parcerias com Carlinhos Vergueiro, Fausto Nilo, um poema de Fernando Pessoa, entre outros novos e velhos parceiros. Fala da expectativa e as perspectivas desse trabalho.

Gravei o "Amor Blue" para comemorar meus 40 anos de músicas gravadas, em 2007. A primeira gravação foi de 1967 pela Nara Leão. Entrei na Lei Murilo Mendes, de Juiz de Fora, e fiz o cd independente com a produção da Fernanda Cunha, minha sobrinha e cantora. Convidei as 3 pessoas que mais me gravaram nesses 40 anos, que foram,Bethania, Simone e Nana, e também 3 cantores mais novos, que gosto: a Fernanda Cunha, Daniel Gonzaga e Celso Fonseca. Todos vieram com o maior carinho e disposição.
Pela primeira vez toquei piano e fiz os arranjos do cd, e, acho que para comemorar mesmo o melhor era gravar coisas novas., isto é, começar tudo de novo. Meu sobrinho, Breno Cunha, fez a foto da capa, meu filho fez o encarte, a Fernanda Cunha produziu, meu amigo e parceiro Luiz Sergio entrou na Lei MM em Juiz de Fora, e o cd saiu assim, com esse amor, todo mundo ajudando. Fui campeã de vendas na Loja Modern Sound, disparada, por quase dois meses. Gostei mesmo de ser independente, fazer tudo, acompanhar toda mixagem, ter noção de que ninguém está mexendo no que vc fez, e pronto, está ali o que vc quer mostrar para as pessoas.

LAM - Como você vê a música brasileira atualmente? Há algum destaque ou está tudo num processo de transição esperando uma mudança radical?

A música brasileira acho que é mais amada fora do país.Temos a melhor música do mundo, assim como o futebol,se a gente puder comparar.Mas sai todo mundo, não é?As cantoras e compositores midiáticos não me interessam, sei que todo mundo precisa trabalhar, tá legal,mas tb tocar só isso, é demais para mim. Acho que as gravadoras estão apanhando da pirataria, mas elas não procuram remediar isso. Vender um cd novo a 40 reais é demais para a minha cabeça.Quem gosta de um cantor quer comprar o cd, mas por esses preços não há como competir com a pirataria.Pelo contrário, alimenta a pirataria


LAM - Quais os projetos e perspectivas por realizar?
Não faço muitos projetos.Faço músicas e espero coisas boas chegarem, isso sim.



Depois dessa simpática entrevista realizada em 04 de maio de 2009, veja mais sobre esta grande artista, acesse o sitio da Sueli Costa e no MySpace.