sábado, março 09, 2013

MARCIO BORGES, UMA ENTREVISTA




Foto: Fernando Fiuza.

MÁRCIO BORGES: OS SONHOS NÃO ENVELHECEM! – Poeta, escritor e compositor musical, é autor, entre outras tantas canções, de “A sede do peixe”, “Vera Cruz” e “Clube da Esquina 2”, com Milton Nascimento, “Contos da lua vaga”, com Beto Guedes, e “Quem sabe isso quer dizer amor” e muitas outras com seu irmão Lô Borges.
Integrante do Clube da Esquina, Marcio contou a sua poética história ao publicar o livro “Os sonhos não envelhecem – História do Clube da Esquina”, onde ele talentosamente conta tudo que se passou desde os anos 60, com suas utopias e anseios, enfrentando a arrogância do autoritarismo, escrevendo letras para canções dos seus parceiros, sonhando um mundo melhor, tomando biritas e muita poesia no ar. Narra no livro os momentos históricos dos últimos 50 anos, como num filme em que ele e seus parceiros são os protagonistas.
O livro “Os sonhos não envelhecem – História do Clube da Esquina”, tem prefácio de Caetano Veloso e posfácio de Milton Nascimento, contando com três partes, a primeira delas abordando sobre o Edificio Levy, Jules e Jim, viagem a Tres Pontas, festival da fome, o vendedor de sonhos, outras vozes e cidade vazia. Na segunda parte ele traz Travessia, Vera Cruz, Beco do Mota, os deuses e os mortos, Para Lennon e McCartiney, Mar Azul e Nada será como antes. Na terceira e última parte, ele conta sobre o Milagre dos peixes, Gran Circo, Pão e Água e muito mais. Simplesmente imperdível.

Depois de realizar duas entrevistas com Milton Nascimento e uma outra com Fernando Brant, agora chegou a vez de um bate-papo com Marcio Borges.

Com vocês, Marcio Borges!

LAM - Márcio, vamos para minha pergunta de praxe: como foi e quando se deu seu encontro com a arte?

Encontrei a Arte a primeira vez passando na porta lá de casa. Eu era menino, convidei ela pra entrar, mas ela ficou lá no portão, me olhando de longe.
Ela fazia coisas impressionantes: rodava a saia, tocava cavaquinho com sete dedos e meu irmão mais velho saía ao portão para acompanhá-la num violãozinho velho, de som rachado. Um dia ela resolveu entrar no meu quarto e se mostrar. Primeiro, mostrou a cara de um jovem homem com a mão no queixo, chamado Chega de Saudade.
Noutro dia, a cara que ela me mostrou foi a de um garoto preto, com ares de príncipe africano. Depois, a fotografia de uma turma de loucos geniais. Quando eu quis cortejá-la pra valer, enchendo meu baú com cartas de amor, ela me convidou para ir ao cinema. Na porta, me comprou umas revistinhas de heróis, alguns livros misteriosos, e me disse que eu precisava aprender a vê-la com outros olhos. Quando tentei fazer isso e olhei para o lado, lá estava uma garota incrivelmente bonita e gostosa. Ela sorriu pra mim, toda convidativa. Saímos quase correndo do cinema e fomos parar no segundo andar de um boteco enfumaçado. Ali sim. Entre garrafas e tocos de cigarro, ela beijou minha boca, escandalosa, surreal. Mas quando eu quis fazer amor de verdade, ela já tinha me dado o fora.

LAM - Quais as influências de infância e adolescência que marcaram a formação do compositor?

Meu tio-avô era maestro da orquestra da PM, minha avó tocava clarinete, mamãe era professora primária e dava aulas de solfejo e canto orfeônico, numa família de onze filhos. Meu pai era jornalista, copidesque, que não nos deixava falar nem escrever errado, ao custo de alguns beliscões raros e radiantemente aplicados. Um dia, ele descobriu uma mala velha que eu mantinha debaixo de meu andar térreo do beliche, cheia de escritos, cartas, contos, versos, ensaios, roteiros, que eram minha expiação e minha vergonha. Eu tinha uns quinze anos Quando vi meu pai com minha mala aberta, lendo e relendo meus escritos secretos, primeiro me senti um menino flagrado dentro do banheiro. Ele olhou pra mim e disse: "você escreveu isso?" Quando eu confirmei com a cabeça, ele ficou muito emocionado: "você está começando por onde eu ainda não cheguei." Recebi aquilo como uma ordem. Nunca mais escondi nada que escrevi. Isso marcou minha formação como ser humano e meu primeiro contato com o leitor.

LAM - O seu começo ocorre com a sua primeira parceria com Milton Nascimento, por volta de 1963, ou já rolava coisas antes disso?

Bom, meu começo foi esse começo secreto que eu falei, em 60, 61. Depois, quando resolvi escancarar, compus um samba chamado "Eu e o Violão" com um garoto vizinho nosso, o Marcelo Ferrari, que deve ser uns dois anos mais novo do que eu. Este samba fez o maior sucesso no Edifício Levy, onde morávamos, era cantado nas festinhas e na portaria. O Bituca também morava no Levy e era frequentador de minha casa, onde rolavam uns ensaios com Wagner Tiso, Marcelo Ferrari e Marilton, meu irmão mais velho. Foi depois desse início aí que fiquei amigo do Milton, Bituca pra nós. Então, certa noite Bituca e eu compusemos três músicas de uma vez só e declaramos definitivamente aberta a temporada de caça aos leões e às garrafas de batida de limão.

LAM - Consta que você tinha uma forte predileção por cinema, fala, então, daquele seu sonho de cineasta.

Minha paixão pelo cinema vem desde meus dez anos de idade, quando assisti o primeiro filme de minha vida, "Simbad, o Marujo", com Sabu. Eu quis ser aquilo, ser o ator, ser a cena, ser o mar, ser o próprio cinema, ser aquela luz jorrando no escuro. Na tal mala velha, o que mais tinha era roteiro de filme. Roteiro de curta, roteiro de curtíssima, roteiro de média, roteiro de longa. Eu era um cinéfilo total, era associado do CEC - Centro de Estudos Cinematográficos - que tinha palestras do Paulo Emilio Salles Gomes, Glauber Rocha, do Dib Luft, do irmão dele, o Sérgio Ricardo, Maurice Capovilla, Ronaldo Brandão, Mauríco Gomes Leite, Cyro Siqueira e tantos craques. A gente via todos os clássicos, de David Ward Grifith a Murnau, Nosferatu, Nascimento de uma Nação, Abel Gance, Hitchcock, Dziga-Vertov, Pudovkin, Eisenstein, Vitorio de Sica, Rosselini, Antonioni, Fellini, Pasolini, Godard, Truffaut, os americanos, John Ford, George Stevens, Raoul Walsh, Howard Hawks, Nicholas Ray, Sam Peckimpah, a gente via e estudava tudo.
Em 1966, fiz um curta-metragem "Joãozinho e Maria", tão doido que o Festival de Cinema Amador JB-Mesbla precisou arranjar um prêmio pra ele que não existia, não estava no script: "Melhor Inventiva Formal". Esse curta foi premiado também no Canadá, no Festival Mundial de Filmes da Juventude da Expo' 67.
Bituca é outro cinéfilo. Até ator do Werner Herzog o cara já foi. Fora suas participações nos filmes do Carlos Alberto Prates Corrêia.
Agora, acontece o seguinte: o cinema foi a arte por excelência do século 20, mas terminou antes do século.
No século 21, então, o cinema está pra lá de morto. O filme virou só mais um produto audiovisual, coisinha à tôa, telefilminho, telinha, televisão, salinha de exibição em shopping center, artigo de locadora de vídeo. Não é mais cinema. Mesmo Hollywood hoje faz outra coisa, mais ligada à indústria da computação e dos eletrodomésticos do que ao espírito das pradarias e do sonho americano.

LAM - Você integra uma família de músicos que, inclusive, são seus parceiros em muitas das suas músicas, ao lado do Milton, do Beto Guedes, do Flavio Venturini, entre outros. Fala, então, do trabalho de "Os Borges", como se deu? E, aproveita, dá um toque sobre o trabalho e relação com seus parceiros musicais.

Aquele disco "Os Borges", no início dos anos 80, foi ideia da Duca Leal, mãe dos meus dois filhos mais velhos. Ela havia acabado de produzir um disco sensacional, uma raridade, que todos deviam ir atrás, da cantora mineira Aline, hoje falecida. Um disco com participações de Wagner Tiso, Toninho Horta, Jaime Além, Jotinha de Morais, Jamil Joanes, Paulo Braga e mais um monte de craques. Aliás, foi a primeira gravação de "Vento de Maio". Por causa dessa gravação da Aline é que a Elis gravou também.
Pois bem, no embalo desta bela produção, a Duca levou a ideia do disco dos Borges ao Adail Lessa, diretor da EMI-Odeon. Ele comprou a idéia e colocamos dentro do estúdio uma verdadeira tropa de elite, tudo canja, tudo tocando de graça, além daquela Borjaiada toda, Elis Regina, Milton Nascimento, Naná Vasconcelos, Guilherme Arantes, Chico Lessa, Toninho Horta, Fredera, César Camargo Mariano, Gonzaguinha, Nivaldo Ornelas, Wagner Tiso, Toninho Costa, Rubinho Batera, orquestra e mais um tantão de gente boa. O trabalho de "Os Borges" então se resumiu a isso. Tentamos fazer uns shows em São Paulo, e até fizemos alguns bons, com casa lotada, mas não éramos suficientemente profissionalizados pra dar sequência. Quem foi, foi. Quem não foi, tratou de fazer outra coisa.
Quanto aos meus parceiros musicais, continuo em atividade principalmente com o Lô. Com o Toninho Horta fizemos agora uma linda "Canção da Juventude" depois de vinte anos, e estou começando uma parceria nova com a sobrinha dele, a genial pianista Diana Popoff, filha do Iuri, contrabaixo.
Com o Beto Guedes e o Bituca, ando meio parado nas composições, mas não no resto, que é a amizade.
O Bituca agora, de parceiro virou concorrente meu, porque ele anda compondo muito mais letras do que músicas.
O Flávio, a gente tem uma fita cheia de temas inéditos, mais ou menos prontos pra ganhar letra.
E pinta um ou outro parceiro novo, como o Rodrigo Borges, meu sobrinho, e o Celso Alves, compositores danados de talentosos, também o Amarildo Silva e o Francisco, do grupo Cambada Mineira, com quem gosto muito de compor. E tem também, quer dizer, teve, o Tunai, que foi meu vizinho em Santa Tereza, Rio. Fizemos umas duas ou três músicas porretas naquela época e só não compusemos tudo que tínhamos direito naqueles dias porque eu era um sujeitinho muito, digamos, avoado.
Agora tô avoando menos, e em (des)compensação, compondo muito menos também. E já vi que ele está cheio de parceiros no glorioso Carpe Diem. Humildemente também me habilito. Ou melhor, me reabilito, no sentido auto-ajuda do termo. E devo ter mais parceiros por aí, sumidos de mim, na poeira dos tempos, no turbilhão da vida, Davi Tygel, Zé Renato....



LAM - No seu livro "Os sonhos não envelhecem" você faz um relato minucioso de descobertas e realizações. Como foi construir uma obra poética libertária e universal num tempo tão adverso como o período da ditadura militar?

Foi como respirar. Foi como gritar junto com o Bituca: "me deixem cantar!". Foi chorar de tristeza e raiva, porque o velho Dorival Caymi não podia mais cantar meus versos, escritos com tanta paixão, "Hoje é dia de El-Rey", porque alguma burocrata tinha censurado tudo. Versos ingênuos? Tudo bem. "A canção mesmo que ingênua / mudou as nossas vidas / guiou os passos que seguimos / que éramos felizes bem sabemos / escrita em nossas almas tão unidas / total garantia que a emoção tomou conta da vida / e tanto amor jorrou" nas palavras do Bituca.

HOJE É DIA DE EL REY
(Milton Nascimento e Márcio Borges)


Filho – Não pode o noivo mais ser feliz
Não pode viver em paz com seu amor
Não pode o justo sobreviver
Se hoje esqueceu o que é bem-querer
Rufai tambores saudando El Rey
Nosso amo e senhor e dono da lei
Soai clarins pois o dia do ódio
E o dia do não são por El Rey

Pai – Filho meu ódio você tem
Mas El Rey quer viver só de amor
Sem clarins e sem mais tambor
Vá dizer: nosso dia é de amor

Filho – Juntai as muitas mentiras
Jogai os soldados na rua
Nada sabeis desta terra
Hoje é o dia da lua

Pai – Filho meu cadê teu amor
Nosso Rey está sofrendo a sua dor

Filho – Leva daqui tuas armas
Então cantar poderia
Mas nos teus campos de guerra
Hoje morreu a poesia

Ambos – El Rey virá salvar...

Pai – meu filho você tem razão
Mas acho que não é em tudo
Se o mundo fosse o que pensa
Estava no mesmo lugar
Pai você não tinha agora
E hoje pior ia estar

Filho – Matai o amor, pouco importa
Mas outro haverá de surgir
O mundo é pra frente que anda
Mas tudo está como está
Hoje então e agora
Pior não podia ficar

Ambos – Largue seu dono e procure nova alegria
Se hoje é triste e saudade pode matar
Vem, amizade não pode ser com maldade
Se hoje é triste a verdade
Procure nova poesia
Procure nova alegria
Para amanhã...


Construir uma obra poética libertária foi construir a nossa própria liberdade. Universal a obra se tornou à nossa revelia, porque a eram nossas filhas, que correram na frente dos pais e rodaram mundo antes de nós. Foram elas que fizeram valer a pena a gente ficar e atravessar a barra pesada, chorando e curtindo, na paranoia e na ousadia, passo a passo, gole a gole, trago a trago, puxando e prendendo, passando a bola, segurando a onda e acolhendo os amigos clandestinos. Entrando nas cadeias. Nas passeatas e palanques.
No livro eu nem fui tão minucioso, só selecionei 12 ou 13 episódios daqueles tempos, aliás, contados com bastante inexatidão. Só depois de cutucado pelos amigos, "olha, não aconteceu desse jeito", "eu estava lá e você não citou." "Não foi em Diamantina, foi na Alemanha Oriental" aí é que eu fui me lembrar de mais umas 20 ou 30 coisas mais precisas que eu devia ter escrito naquele livro. Que pena, já estava feito!

LAM - E agora nesse inicio de novo milênio, como você vê o Brasil? A esperança resiste ou os tempos são outros para novas descobertas?

Amigo, eu vejo o Brasil totalmente contraditório dentro desse mundo porra louca e contraditório. O Brasil é o avesso do avesso do avesso. O mundo todo está uma porcaria, aliás, dominado por essas "imporcorações" transnacionais todas aí. Escapou das mãos de Stalin e Hitler, sobreviveu a Hiroshimas e Pearls Harbors, Garrastazus e Pinochets, mas não escapou das garras do Bill Gates, do Steve Jobs, dos meninos do You Tube e do Google, os atuais seis ou sete donos do mundo. Caralho! E tem o Lula, o Obama!
Por falar nisso, a Dilma foi minha amiga de adolescência e outro dia ela se lembrou de mim numa entrevista de uma revista feminina, dizia toda convicta, e com razão, porque ela também viu de perto essas coisas todas acontecerem: "você sabia que o Clube da Esquina começou na casa do Marcinho?" Quando eu li aquilo me lembrei de nossa juventude e confesso que chorei. Se dependesse daquela amiga, minha esperança continuava para sempre a correr solta nas ruas de Belo Horizonte, "Tupinambás, Aymorés, todos no chão."

LAM - Para você o que você faz é poesia ou letra? A seu ver é a manutenção da tradição de excelentes construções poéticas da música brasileira e o caminho da poesia contemporânea é outro, ou as duas se confundem dificultando uma distinção entre ambas?

Essa velha, clássica, e sempre boa discussão...
Eu e o Telo Borges, meu irmão, de vez em quando damos umas oficinas de criação de letras e músicas, para pessoas de qualquer idade, relacionadas ou não com a música ou as atividades ditas culturais. Quer dizer, pra qualquer um que se habilite. Numa delas eu comecei dizendo que o letrista mais antigo que eu conhecia era um tal de Homero, que havia composto duas enormes músicas chamadas Ilíada e Odisséia. Claro que isso era só uma "boutade", fazia referências não muito exatas ao mundo grego, porque na verdade os coros vieram depois de Homero, nas festas dionisíacas, onde surgiram os ditirambos cantados, bla bla bla.
Tem Aristóteles, tem Hegel, tem Nietszche, tem muita gente boa que gastou muito tempo explicando o que é poesia, onde residem o fato e o fazer, etc e tal.
Tem o Mallarmé dizendo que um poema não se faz com idéias, mas com palavras. Acho que ele, com isso, queria dizer o que eu mesmo penso desse papo: a poesia é um estado especial de receptividade dos sentidos e da mente humana, sensibilidade que pode ser provocada por um entardecer magnífico, uma lembrança emotiva, uma brisa, um gosto, uma ideia ou um encadeamento sonoro de instrumentos e palavras.
Agora, o poema e a letra de música não são isso. São resultado de uma operação humana de outra ordem, mais complexa. Elas são frutos de um fazer. Por isso mesmo, essas duas formas de fazer tem mais coisas em comum do que são estranhas entre sí.
Primeiro de tudo, ambas são construidas por palavras e vocábulos. Ambas conduzem ritmo. Ambas ocorrem numa duração, no tempo, e não no espaço. Ambas buscam despertar aquele sentimento de que falei, de receptividade especial dos sentidos, a tal poesia. E qual a diferença fundamental entre cantar e recitar? Respiração? Entonação? Inflexão? Seja o que for, não está na poesia.
O Brasil tem excelentes poetas-poetas, como o Carlos Figueiredo, Claudio Willer, Edson Cruz, Tonico Mercador, dezenas, centenas de ótimos poetas, dos que publicam e recitam, e tem também dezenas de excelentes poetas-letristas, como alguns caras do rap, os caras do Rappa, o Arnaldo Antunes, o Murilo Antunes, o Chico Amaral; alguns me incluem aí, mas eu realmente me incluo mais da praia do Ronaldo Bastos e do Fernando Brant, do Erasmo Carlos, do Paulo Sérgio Valle, somos uns fazedores de canções, uns operários das letras.

LAM - Para você, qual a situação do compositor nesse tempo de pirataria e crise do mercado fonográfico?

Situação volátil. A indústria fonográfica vive uma derrocada irreversível. Os últimos dias de Pompéia. Um salve-se quem puder.
Agora os ex-magnatas querem se agarrar ao que resta, já que a sua fabriquinha de vender bolachas redondas com buraquinhos no meio não tem mais utilidade, porque agora os ex-compradores preferem fazer em casa. O que restou então, o que eles finalmente enxergam agora, nos seus estertores, foi o conteúdo. Ah, agora eles reparam que o conteúdo da bolacha é o próprio artista, o compositor. Então, vamos investir tudo nas editoras, agora. A bolacha acabou, viva o recheio da bolacha! Creative Commons, etc e tal. Pra enriquecer ainda mais o Bill Gates, o Steve Jobs, os meninos do You Tube e do Google, mas pelo menos, pensa o derrotado, sobra uma merreca pro ex-poderoso executivo da quase extinta indústria fonográfica, se ele topar fazer uns DVDzinhos aí, colocar na internet, etc.
Pô, a internet já tem dono. Quem acha que não, feche o computador ou crie outro código. Quer saber? Eles que se fodam agora, porque o artista já estava fodido faz tempo.


Imagem: Milton Nascimento e Márcio Borges no lançamento da Associação dos Amigos do Museu do Clube da Esquina. Belo Horizonte, MG - 2004. Foto: Juvenal Pereira Site Museu Clube da Esquina

LAM - E o projeto do Museu Clube da Esquina? Fala a respeito das propostas, atividades e realizações dele. O sítio do museu é muito interessante, o conteúdo tem além das composições do grupo, também uma série de seções como de quadrinhos, exposições, trabalhos acadêmicos, entre outros. Quais as perspectivas?

Já fizemos muitas coisas nesses 5 anos de operação viva e virtual, muitos shows, eventos, exposições pelo Brasil todo, palestras, oficinas, parcerias, quase tudo realizado graças ao trabalho incansável da Claudinha Brandão, idealizadora, produtora executiva e locomotiva do Museu Clube da Esquina. A ideia original, de juntar essas atividades todas num espaço físico dedicado à preservação de memória e criação musical, esta depende do Estado e do Município. Aí precisa ser, não é? já viu. Em duas palavras: Dom Quixote. Em uma: Sísifo.

LAM - Quais os projetos que Márcio Borges pretende realizar?

Pretendo realizar o espaço físico do Museu Clube da Esquina em Belo Horizonte, do jeito que a arquiteta Marisa Hardy projetou. Não importa quanto tempo isso vá demorar. Se eu morrer antes, meu fantasma vai assombrar o ex-cine Santa Tereza até a Prefeitura doar o lugar para o Museu. Enquanto estou vivo, pretendo publicar dois livros ainda este ano, sendo um romance de ficção e uma coletânea de textos históricos. Pretendo continuar compondo, escrevendo livros, dando palestras e oficinas. Se ainda houver tempo, pretendo também virar mascate, como aqueles das mil e uma noites, sair por aí vendendo trapizongas e truques mágicos em praça pública.
Quem quer comprar meus sonhos?